domingo, 31 de maio de 2009

Profícua recolha

Só depois de me ensinar os segredos que não entendo por não saber decifrar e de descobrir um atalho como alternativa a longos caminhos, posso despedir-me sem remormos ou lamentos. À custa de fadigas sem nome vivi a minha vida escondida no ventre de campos onde fiz crescer os cereais. Foi com peças de ontem e com a ordenação de hoje que me coloquei numa cadeira de poderio incontestável deixando para os mortos os buracos soturnos onde vivi pasmada tanto tempo.
Os dias aconteceram naquele castelo medieval sempre de forma rotineira, até na altura das invasões a estratégia era a mesma, corria para o abrigo das muralhas do castelo, acedendo a uma ponte levadiça feita de madeira maçica e ferro. Em corridas exaustivas e pesadas refugiei-me no rústico e frio contexto sujeitando-me sempre à frialdade que não conhecem os gelos polares. Presa dentro de mim e rodeada de um corpo rochoso, foi na dureza de rochas metamórficas modificadas pelos efeitos da temperatura e da pressão,que fiz as minhas primeiras ferramentas para evitar tornar-me fóssil. Desconfio que até como fóssil seria complexa sendo apenas identificada por quem me olhasse com paciência e cuidado, mostrar-se-ia infrutifero alguém chegar e limitar-se a meter a pá na terra.
Passei a não procurar sempre abrigo nas mesmas peças e viver em sensação de controlo passou a ser ordem. Sequencialmente,comecei a enumerar capítulos e lutei para que a mão nunca tremesse por ver as coisas levantadas.
Recolho do tempo as folhas que soltei e calco sulcos de solo instavel para tentar aplanar qualquer depressão linear que se imponha. É assim que tenho olhado para as questões que me assaltam e cada problema que recolho e resolvo, foi mais um mistério que desvendei.

1 comentário:

  1. Aprender, desvendar, aplanar... Diversas acções no mesmo manifesto de intenções. Antes do agir existe o incorporar em nós e tomar como substância própria, tornando tão natural e inato como respirar. Se não o fizermos morreriamos, mas conscientes do mesmo, considerariamos a mais árdua e monótoma das tarefas.

    Vive...

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