sexta-feira, 3 de abril de 2009

Os meus sentidos





Sou a pedra arremessada para o mundo, que hoje tenta desfazer entre os dedos ressequidos a dimensão do nada que afinal sempre fui. Procuro outro eu dentro de mim capaz de me mostrar que ainda tenho livres as minhas mãos para poder, além da mesa do oleiro, moldar a peça final.


Já não sei onde tenho os olhos porque estão desgastados pelo uso que lhes dei e não consigo ver onde nem quando deixaram a própria casa. Mesmo assim, a minha mão cai para o lado das estrelas deixando a minha boca aberta sem respiração. Ai a minha boca... Um campo minado que se entregou ao silêncio que explode sempre com um sorriso rouco, trémulo e inacabado.


Ouço alfinetes a tocarem o meu peito, como se fossem trovões a discutir. Os meus ouvidos febris e atordoados deliciam-se em músicas de amores e naufrágios movimentando o meu corpo obrigando-o a dançar músicas de tempestade incapazes de apagar o fogo mais despótico e cruel.


Como são imperfeitas as pétalas de seda pura que enfeitam o meu peito! Sinto o odor do rio escurecido onde me banhei, ficando abandonada nas margens fabulosas de um sonho. Resta-me segurar nas mãos o terço, ouvir a neve derreter, olhar a lâmpada ainda acesa, cheirar pétalas de jade e com os meus lábios orar pelo que há-de vir...

1 comentário:

  1. Como é sempre tão difícil tecer comentários a respeito de algo ou alguém! Contudo, não posso ficar calada e prefiro render-me a isto... Como entendo o que dizes e escreves, como conheço o silêncio que calas e consentes, como sei desse riso feliz e limpo!
    Continua a escrever, verte tudo como se fossem bolas de sabão a voar.
    Da tua sempre amiga, Lene

    ResponderEliminar